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Gaston Bachelard em seu livro O Ar e os Sonhos: Ensaio sobre a imaginação do movimento,​ escreve: 

Pretende-se sempre que a imaginação seja a faculdade de formar imagens. Ora, ela é antes a faculdade de deformar as imagens fornecidas pela percepção, é sobretudo a faculdade de libertar-nos das imagens primeiras, de mudar as imagens. Se não há mudança de imagens, união inesperada das imagens, não há imaginação, não há ação imaginante. Se uma imagem presente não faz pensar numa imagem ausente, se uma imagem ocasional não determina uma prodigalidade de imagens aberrantes, uma explosão de imagens, não há imaginação. 

O estudo fenomenológico proposto por Bachelard em seu livro Poética do Espaço​  nos auxiliou a realizarmos uma abordagem dos valores de  intimidade do espaço interior em tempos de COVID 19. Convidamos os alunos a imaginar a casa que hora habitamos, repletas de novos sentidos impostos pela pandemia e pelo isolamento. 

Nathan Balzani

O protótipo de Nathan faz referência a sensação de virtualização que vivemos no momento. Enquanto as janelas virtuais estão todas abertas, as janelas físicas se fecharam, porque é perigoso sair - seja pelos olhares alheios, seja pela pandemia de coronavírus. Não há janelas, é um antro que se protege dentro do próprio antro. 

Assim, resta um espaço gigante para imaginação e para a criação de mundos internos, porém pouco espaço para a expressão externa. Essa sensação se torna perceptível quando observamos que o único céu presente está dentro do próprio espaço e é seu chão. 

Giulia Faleiro

O protótipo de Giulia remete muito ao mundo infantil e surge como um refúgio de reconexão consigo e com sua magia, seus sonhos e seu encantamento.

Durante o momento de pandemia muitos sonhos foram perdidos e também o contato com seu eu interior criança, assim reconstruir seu espaço e se reconectar consigo mesma é justamente um processo de aprender a se reconectar com todo esse universo. 

No centro do protótipo existe uma foca, e a medicina da foca faz referência justamente a proteção durante a mudança, a imaginação, o sonho lúcido e a voz interna. 

É um espaço aberto na parte superior, porém protegido por uma espécie de tela, ou rede, para que seja possível ver o mundo lá fora, porém que esse olhar para fora também seja um lembrete de se manter dentro do seu próprio espaço para se proteger - até porque a magia, o encanto, os sonhos e o poder são ferramentas essenciais para o artista.

Maísa Vaz

O protótipo de Maisa remete a conexão com a paz e a tranquilidade de seu mundo interno, assim traz um pôr do sol no centro do protótipo porque observar o pôr do sol foi um hábito que ela cultivou durante a pandemia para se conectar com essa paz e essa tranquilidade interna. Como seu espaço remete ao céu, ele não se fechou, se manteve aberto, porém na parte de fora é possível ver figuras que remetem a galhos, mas também remetem a rachaduras. 

A interpretação dessas figuras externa como rachaduras também se conecta com um possível olhar sobre a pandemia de coronavírus, pois perceber essa realidade é como uma rachadura, que quando começa só se amplia; quando começamos a refletir sobre esse processo da pandemia, é uma reflexão que também só se amplia dentro de nós. 

Drêh Machado

“Era uma casa muito engraçada, tinha seu teto materializado por lembranças muito especiais, pois somente aquelas selecionadas buscamos levar para a vida toda. Já com desgaste deixamos no quarto do esquecimento, onde habita apenas os restos esquecidos. Caso lembrados, se mantém no seu papel e seus resultados se baseiam pelas novas vivências, onde determinamos onde cada memória se encaixará.” 

 

O protótipo de Andressa trabalha com a dicotomia entre os significados de porão e sótão, onde o representa sótão a memórias especiais e o porão representa o desgaste e memórias esquecidas. Há ainda um terceiro elemento que são os corredores da casa.

A mão representa o sótão. Isso porque a mão é uma força muito presente no corpo e também é uma parte do corpo que se conecta a outra, podendo exercer  tanto o amor quanto o ódio.O porão é o lado externo do protótipo, onde está a insegurança e as fragilidades, onde há um peso pela situação de pandemia vivida. 

É um espaço que se abre e se fecha, pois é confortável estar dentro, mas também é necessário sair. Assim, percebemos como o espaço também remete a um arredondamento, pois embora a gente caminhe em linha reta, é necessário sempre prosseguir e darmos a meia volta para aprender a lidar e a ressignificar nossos erros. 

Luísa Braga

O protótipo de Luísa remete muito ao processo interno e externo enquanto dicotomia, onde o externo reflete sobre processos desafiadores e negativos enquanto o mundo interno reflete sobre os processos construtivos e positivos. Essa dicotomia fica evidente quando percebemos como o mundo externo possui poucas cores em relação ao mundo interno

No mundo externo estão reflexões sobre desafios, sentimentos ruins, tristezas e angústia enquanto o mundo interno remete principalmente ao cuidado, porque é a necessidade e a ação do cuidado que faz com que a gente siga vivendo nesse mundo e sendo quem nós somos. Além disso, no mundo interior há uma referência ao amor próprio, por ser outro pilar de construção do seu mundo interno. 

Existe uma representação de si no protótipo, onde um dos elementos principais é o coração, pois o coração também é a chave de conexão entre o processo interno e o processo externo. Por fim, o corpo está de fora, porque ele está próximo ao que está fora também, porém ele vê tudo e por isso não tem medo. 

 

"Deixar que os fatos sejam fatos naturalmente

Sem que sejam forjados para acontecer

Deixar que os olhos vejam os pequenos detalhes lentamente

Deixar que as coisas que lhe circundam estejam sempre inertes

Como móveis inofensivos, para lhe servir quando for preciso

E nunca lhe causar danos, sejam eles morais, físicos ou psicológicos"

(Corpo de Lama, Chico Science e Nação Zumbi)

Eduardo da Conceição Santana